sexta-feira, 15 de outubro de 2010

vigiar e punir




Resenha
FOUCAULT,M. Vigiar e Punir. Petrópolis: Vozes, 1987
Terceira parte, p.125-269. Disciplina

Foucault propõe, na terceira parte do livro, uma análise da evolução da disciplina e seus usos enquanto ferramenta de poder no decorrer dos séculos XVII e XVIII, avanços que a tornaram generalizável. Tão "brilhantemente" difundida nas várias instâncias da trama social, que chega a ser tomada como intrínseca, natural a sociedade. Essa análise intenta exatamente lançar luz sobre o momento em que a disciplina passa de uma técnica usada em situações pontuais para uma "trama infinitamente cerrada" em cada célula do organismo social; correlata a amplos processos históricos: econômicos, políticos, jurídicos e científicos.
No século XVII, as técnicas de adestramento apresentavam-se numa forma mais primitiva, fundamentadas no binômio retirada-violência. Tinha utilidade somente em realidades bem definidas como colégios, espaços hospitalares e militares, mas esse uso comum não era capaz de relacionar essas instituições. Era um uso descontínuo e muitas vezes conflitante e dispendioso.
O século XVIII é marcado por uma grande explosão demográfica e pelo crescimento do aparelho de produção. Esse novo cenário mais complexo, onde a burguesia foi tornando-se a classe politicamente dominante; o cenário da economia capitalista, precisa de estruturas disciplinares também mais complexas. Capazes ao mesmo tempo de ordenar e tornar útil toda essa força potêncial da maneira menos custosa.
Da observação de técnicas de treinamento para que homens comuns se tornassem soldados percebe-se o poder de manipulação do corpo em suas duas naturezas: útil e inteligível; descobre-se o corpo como objeto e alvo de poder.
Os processos de adestramento sempre existiram, mas no período clássico, como consequência dessas observações, eles ganham refinamento e aceleração pois é visto como estratégia de concretização de interesses políticos e econômicos.
O método Panóptico, de Bentham, que surge na época, responde bem a essas interesses. É uma figura arquitetural que encerra em si todas as características de um programa disciplinar ideal: fixa os individuos, determina funções, estabelece uma clara hierarquia que possibilita vigilância, sansão e exame de processos e individuos, além de fazer uso de todas as técnicas de otimização do tempo e das forças da multiplicidade sobre a qual vai agir. Acima de tudo isso, desenvolve em cada integrante do mecanismo uma consciência disciplinar subjetiva que garantirá seu funcionamento por si só.
A sociedade utiliza essa "simples" idéia como pano de fundo em todos os seus desdobramentos. Passa então a abrigar uma ambiguidade no âmago de algumas de suas instituições mais fundamentais, mais caras.
A forma jurídica, um sistema de garantia de direitos instituido nesse período conhecido pelo lema "liberdade, igualdade, fraternidade", analisada a luz dessa discussão, não passa de uma astúciosa engrenagem que só é possível alimentada por essa concepção disciplinar que é originalmente contrária ao lema que a institui.
As ciências (principalmente médica, pedagógica, do trabalho) desenvolveram-se muito graças a burocratização dos processos, característica do disciplinamento das atividades. Mas seu produto contribuiu e contribui para uma forma de controle cada vez mais tênue.
O exército representa uma força coercitiva de armas com sua estratégia e uma força positiva na sociedade com sua tática, enquanto modelo de disciplina. A mesma força que gera a guerra gera também a paz.
Foucault aborda o poder como algo que transpassa a sociedade visando sempre a homogeneidade, a normalização e todo aquele que desvia da norma deve ser punido, pois compõe uma ameaça ao sistema.


Foucault é bastante detalhista nesta obra, não sei se especificamente por sua proposta neste capítulo ou se por estilo, mas essa caracteristica ajuda bastante na compreensão da idéia. Enquanto analisa os exemplos vai construindo o conceito e o uso de retomadas ao final de cada módulo não deixa que se percam as principais caracteristicas.
É uma leitura de grande relevância, pois permite de fato uma desnaturalização da questão da disciplina que se vende como valor da moral indispensável as relações sociais. Presente na instuição que constitui nosso foco de estudo, a escola, ainda que de forma conflituosa.
Permite-nos olhar para o dito "anormal", categoria que se multiplica em ritmo acelerado, com olhos mais atentos uma vez que estes tornam-se, então, a resistência a um mecanismo que como ficou demonstrado, não é tão natural assim, permitindo-nos vislumbrar um horizonte diferente, talvez, daqui a algum tempo. Por enquanto resta-nos pensar numa prática que, conscientizada do poder que tem, ajude a formar homens também conscientes e críticos.





By Verônica Fonseca

Um comentário:

Maurício Sampaio disse...

E haja técnica de adestramento... Foi lenge e faucaulteou legal! Adorei a resenha!! Se seu prof. não der nota máxima, me avisa que eu dou um jeito!